OS RATOS
Magaly Andriotti Fernandes
Domingo fui
assistir um filme no museu próximo a minha casa. Nesse mês o museu está
promovendo cinema e debate. Fica à beira do rio. Foi construído para que de
suas janelas nos mostrem a cidade com uma obra de arte. Ali fiquei, segura, por
bons momentos. Amo minha cidade. Amo e
tenho medo. Dentro dos lugares não chego a ter medo. Quando penso nisso me vem
a lembrança do homem que entrou no cinema e saiu atirando. Credo! Nem a imagem
linda de um dia de sol à beira do Guaíba me faz esquecer as macelas da
sociedade.
O filme, de
David Lynch, Mulholland Drive, fala de uma personagem que manda matar sua amada
por ódio, por disputa, e sente remorso, sente medo e sonha, melhor tem
pesadelos horríveis. O filme não deixa claro quando é sonho ou quando é
realidade. A pessoa que inicia o debate nos faz centrarmos na realidade. Lembro
que tem jogo no estádio próximo. Um jogo importante. O motorista do taxi que me
trouxe avisou que vai haver um arrastão. Entro em emergência, saio, não termino
de escutar o debate que estou gostando. Na rua final de tarde um pôr do sol
magnifico. Penso em ficar por ali, sentar e sentir. Não posso, agora sou um
rato, assustado. Na minha cidade tem gente que mata, que degola, por nada, por
poucos trocados.
Respiro fundo
para ver se o medo foge, que nada sou um rato, olho para todos os lados, ligo
para um amigo que me avisa que o jogo está quase terminando. Corro, chamo o
carro que vai me levar para a minha torre. Lá no nono andar onde moro me sinto
segura. Lá penduro minha roupa de rato na porta, ao lado de fora.
Caso ligue o rádio
pela manhã, a primeira notícia é de morte, assalto e furto. Senão ligo e desço
para caminhar, tem um grupo de vizinhas que fica sentada tomando chimarrão, que
são as verdadeiras caturritas do apocalipse. – Cuidado, caminha aqui dentro,
não vai para a rua. Disparam várias histórias de pessoas que foram assaltadas
nas proximidades. O rato ainda dorme. Caminho assim mesmo, oro para o meu anjo
da guarda e sigo. Ele, o rato, já acordando, olho para todos os lados, ao menor
barulho pulo, salto, meu coração dispara. Isso lá é vida. Morar na capital do
Estado me transformou num rato. Um rato assustado e apavorado.
Ratos , ou não, a gente vai levando...
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