Minha mãe para além da maternidade
Magaly Andriotti Fernandes
Minha mãe precisou morrer para que eu me desse conta que ela
para além de minha mãe era uma mulher surpreendente.
Por volta de 2012 em busca da minha espiritualidade, e numa
das vivencia a coordenadora pedia que nos imaginássemos como nossas mães, o que
elas pensavam, o que elas gostavam de fazer, seus amores e outras questões.
Trabalhávamos nossa ancestralidade, fazendo esse exercício com as avós e
bisavós.
Até ali minha mãe, era apenas minha mãe. E eu já nessa época
era avo. É muito chocante.
Dei-me conta que minha mãe era uma mulher, que era esposa do
meu pai, mãe dos meus irmãos, tia, irmã, filha, e muito mais. E pensei que eu
pouco sabia daquela mulher.
Minha mãe uma costureira, que aos oito anos já iniciou a
trabalhar em casa de família. Família essa que ensinou a costura. Por um
período modista, e depois resolveu trabalhar em casa, para cuidar dos filhos.
Com esse fazer ela sustentou-nos e nos permitiu ingressar na universidade, algo
que ela não deve chance. Ela estudou até a quarta série primária. Adorava ler,
e para mim ela passou esse gosto. Durante minha infância lembro dela lendo a
noite. Tinha muita dor de dente, e ela lia, lia, na tentativa de me fazer
dormir e de que a dor parasse.
Quando eu nasci, conta a lenda, que ela queria um menino. E
durante toda minha infância eu tive um comportamento assim como o de um menino.
Sim porque meninas não deviam subir em arvores. Meu cabelo ela cortava bem
curtinho, naquela época era moda um corte chamado “rapazinho”. Eu tinha vestido, saia, mas a maior parte
usava short. Não tinha “modos” ela dizia, não sentava direito.
Eu aqui já falando de mim. Eu sempre a via trabalhando.
Passava noites em claro costurando. Nunca atrasou uma encomenda. Ela tinha
muitas freguesas. Ela adorava costurar, fez muitos cursos para se aperfeiçoar,
de corte de calças, blaiser, roupas intimas, fantasias. Ela bordava como
ninguém. Fazia tricô, esse só para nos da família. Ela não gostava de cozinhar,
mas o fazia quando necessário. Minha avó que morava conosco cozinhava.
Minha mãe não era a filha mais velha, mas sempre sustentou
afetivamente sua família de origem e a constituída. Seus irmãos e irmãs quando
precisavam de ajuda e para ela que pediam. Ela cuidava de todos mas não cuidava
de si.
Ela amava meu pai. Nunca se viu falar mal dele, mesmo ele
sendo um jogador compulsivo e colocando a perder as conquistas matérias do
casal. Através do olhar dela e de sua
fala eu também era apaixonada pelo meu pai. Ele não era um mau homem, sempre
trabalhou muito. E como ela também demonstrava prazer pelo que fazia. Faziam o
que gostavam e faziam bem.
Minha mãe me ensinou cuidar da casa, dos filhos, do marido.
Minha mãe me deu condições para que eu realizasse meus sonhos para além da
família.
Na adolescência, e por um bom período eu queria tudo, menos
ser parecida com ela. Imaginava que ela não gostava de mim.
Quando meus filhos nasceram eles foram para escola maternal.
´Para minha mãe eu era uma bruxa, porque não os deixava com ela. Aliás nos duas
nunca nos entendemos muito, eu era muito diferente do que ela havia imaginado,
porem ela sempre acreditou em mim.
Tarde descobri, mas para além de minha mãe, ela era uma
mulher e uma pessoa incrível.
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