Amanhecer em casa
Magaly Andriotti Fernandes
Depois de passar setenta dias na
Itália, indo de cidade em cidade, chegar, sentar a poeira é um pouco difícil.
Passei um ano programando meu retorno para estudar italiano, a língua e a
cultura. Decidir quais cursos, quais cidades diante de um pais com belezas tão
singulares.
Os primeiros trintas dias minha
base foi em Casalbordino, no Curso Scuola Nova Arcadia. Morei com uma
brasileira de São Paulo, e uma argentina
de Mar del. Prata, na via Fontana número 5. Uma cidade pequena, com mais ou
menos 4 mil habitantes. Cidade medieval, onde a agricultura, a fabricação de
vinho e óleo de oliva é prioridade.
O sol esteve comigo quase todos
os dias do percurso. Aqui na região de Abruzzo viajamos por Vasto, Pescara,
Chieti, Ortona, Agneno entre outras. Castelos, agro turismo, até fazer pasta na
chitarra um instrumento do medievo eu fiz. O sino da igreja toca a cada quinze
minutos. Sempre que nasce alguém ele toca, sempre que morre alguém ele toca. Em
abril tocou quinze vezes por morte. Uma cidade de anciãos. Na missa conversei
com uma senhora de 103 anos que mora sozinha, ativa e com projetos.
Casalbordino
é uma cidade acolhedora, com alimentos saudáveis a bom preço, uma dieta
mediterrânea. Peixe fresco comprado de uma pescadora de 72 anos. Uma mulher
feliz com sua relação com o mar.
O canto
lírico, a história da língua italiana, Dante Alighieri e outros, a cada igreja
muitos afrescos. Em minhas fotos estou sempre sorrindo...sim eu me sentia
literalmente viajando, uma viagem espacial, transcendental, imersa na cultura
Escolhi
a Itália pois meus bisavós maternos de lá vieram, da região de Veneto, que
deixei para visitar numa próxima ida. Fui a Veneza pela segunda vez e o choro
compulsivo uma presença obrigatória. A praça de San Marcos para mim é um lugar
sagrado.
Estive
em Alberobello e em Polignano ao Mare. O primeiro terra dos trullis, casa
pequenas feitas de pedra sem cimento, pura magia. Onde se come uma das melhores
sobremesas: “teta de la mama”. E a
segunda, mar e rochas, um contraste sem palavras. Nela tem a estátua do
escritor da musica Volare, tão conhecida por nós brasileiros. Êxtase, era assim
que me senti nesses lugares. A estrada toda florida pela plantação de damasco e
cerejas.
Outros
trinta dias em San Severino Marche, minha escola do coração, a cada ano estão
melhores, professores apaixonados pelo que fazem, estudiosos, te fazem aprender
de forma amorosa e lucida. Da região de Marche revi, a Gruta de Franzassi, a
florida Spello, Spoleto, Assis (onde se sente ali a presença de Santa Clara e
São Francisco de Assis), Gubio e a história de Francisco e o lobo. Macerata e o
Sferisferio, onde pensei que nessa volta conseguiria ouvir uma opera, mas
cheguei muito antes da temporada. Firenze a bela cidade da arte renascentista,
dessa vez consegui entrar no Domu, ir na Academia de arte, ver original do
Davi.
O
terremoto no início do ano com epicentro no monte Sibili, não permitiu o
retorno a Norcia, e Caltelmucio, mas ensinou a força desse povo.
As duas
últimas semanas passei em Roma, vi o Papa duas vezes, ouvi uma missa toda em
latim com cantos gregorianos, vi a Pieta. Na Capela Cistina, literalmente voei,
lindo demais, Michelangelo foi um gênio, a tridimensionalidade de sua obra, nos
insere e nos transporta. Cada rua tem um pouco da história, o perfume dos
jasmim poeta, o vento do deserto, me fez
sentir que tinha 12 anos, e ouvir minha professora do ginásio contanto o
percursos dos romanos na conquista pelo mundo. O Coliseu e seus corredores, as
cenas de leões devorando pessoas, para mim elas estavam ali postas, vivas
ainda.
As
fontes, a Fontana de Trevi, essa que me embriaga, que me dá vontade de jogar-me
e sair nadando, ou de ficar ali simplesmente boiando naquelas aguas límpidas.
Muitos turistas já o fizeram, multa de 400 euros. Sonhar de ir a Fontana e não ter ninguém
pelas ruas, pois Roma é uma cidade onde milhares de pessoas por lá passam,
nunca se esta sozinho, sempre se disputa um lugarzinho ao sol. Ruas com
músicas, clássica, popular, com apresentações teatrais.
Por
setenta dias, todas as manhas eu estava em sala de aula. Chegar, retomar a
rotina, refazer projetos, inserir-se.
Porto Alegre, 17/07/2017
Nenhum comentário:
Postar um comentário