sexta-feira, 17 de junho de 2016

O gatinho amarelo


               Lá estava eu entre os retalhos de pano e os retalhos da memória. Uma malha amarela se apresenta. Fazer o que? Um gato, uma coruja, uma girafa…olho  nas revistas, olho na internet, moldes diversos. O gato esse animalzinho tão misterioso, que tanto me apavorou e hoje através de meus netos passei a conviver bem.
               Um gato parece ser uma boa escolha, as meninas, minhas netas amam gatos, meu neto também. Fazendo os acabamentos, quando vou bordar os olhinhos, sai do enchimento um pedacinho preto, que serve como pupila , ele é cheio de meias velhas, coisas de vovós, onde já se viu encher um bichinho de pano com meias velhas?
               Meu neto mais velho olhou o bichano e o batizou, Batata. E aí o Batata, lembra a paixão perdida da neta do meio, a Mis Miau, sua primeira gatinha. Sua gatinha atual a Amora.  Os gatos são significativos nessa família. É o Batata agora ajuda pegar no sono, ver os programas preferidos desse trio.
               Os gatos tem se feito presentes no meu cotidiano. No meu prédio, observei, moram no pátio, três gatos pretos cuidados por uma vizinha que não os assume integralmente, um amor parcial. Digo isso porque ela apenas os alimenta, não os leva no veterinário, não os vacina, as vezes conversa com eles e só isso. Como é ser dono de animais? Que cuidados requem esses bichanos?
               Outro dia ao sair para caminhar, na porta do meu apartamento, quem vejo? Um gato amarelo em pavor. Ele com medo de mim e eu com medo dele. Como vou sair de casa?  Interfono para o porteiro que me relata que o vizinho o esqueceu na rua. Corro até a escada e desço, numa manobra arriscada, minha vizinha do lado fica falando com o gato e eu escapo; quando volto o vizinho já o havia levado para dentro.
   Em visita a sogra do meu filho no interior do Estado, sua gata, a Lua Play, sim esse é o seu nome, toda branca e macia, vem e deita no meu colo. Eu que tenho muito, mais muito medo de gato, estou ali com aquela gatinha. Ela me adotou, agora eu, ela e minha pequena neta, formamos um trio, por momentos. Surpreendo-me com essa possibilidade. Lua Play não me unhou, não me mordeu, e ficamos ali num convívio pacifico e gostoso, no solzinho.
               No passado os gatos, eram objetos dos meus pesadelos, diurnos e noturnos. Meu analista tinha um gato. Quando chegava para a sessão seu gato, sabedor dos meus medos, estava ali na única cadeira existente na sala de espera, esparramado, ronronando todo poderoso. Eu ficava em pé, sem mesmo me mexer. Por muito tempo foi assim. Na hora da consulta, ele cheio de si passava pela vidro da janela, para que eu o visse, me olhava e afirmava o seu poder. Bem eu estava ali para me tratar. E parece que deu certo.
               Esse mesmo gato, nos nossos grupo de estudo, o que fazia? vinha com seu longo rabo e ficava passando sob a mesa, mas apenas perto de mim. Eu querendo me mostrar corajosa, morria por dentro, mas nada falava. Hoje quem sabe ele ocupasse o meu colo e poderíamos estudar juntos.
Minhas netas tem agora a gatinha tricolor Amora. Quando vem para mim casa ela as acompanha. Os gatos dormem de dia e vivem a noite sabiam? Amora já me deu vários sustos. Outro dia me deu uma mordida no dedão do pé. Agora já sem medo posso  conversar com os gatos, toca-los, amacia-los, eu e Amora nos tornamos grandes amigas.
Refleti muito sobre o meu medo dos gatos, minha mãe quando eu ainda não era nascida, tinha uma gata, e essa gata, deu cria no enxoval dela, todo bordado em linho branco. Minha mãe ficou com muita raiva da gata. Nunca nos deixou ter gatos em casa.  E meu avô, seu pai, nas história de terror que contava, os gatos estavam associados as bruxas, ao diabo, e sim minha infância tinha sido povoada de crendices e pavores. Meus netos já não tem esse pavor, veem os gatos como são, em sua singularidade e mistério, mas sem medos.
Enfim, o Batata, é um gato mágico, o gatinho amarelo que nos faz dormir, um companheiro que integra três gerações.
Magaly Andriotti Fernandes

Porto alegre, 14 junho 2016.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Histórias que Pintam:  "As cinco direções de um corpo" é o novo livro e...

Histórias que Pintam:  "As cinco direções de um corpo" é o novo livro e... :  "As cinco direções de um corpo" é o novo ...