sábado, 24 de setembro de 2016

                                                      O silêncio

                                                                                                               Magaly A Fernandes





                Fiz um retiro de oito dias de silencio.  Na busca de um espaço próprio, descobri a Vila Fatima, em Santa Catarina, que fica na beira do mar e da lagoa. Um espaço paradisíaco. E ainda conta com o auxílio de um padre jesuíta para ir trabalhando o que o silencio produz, se necessário.
                Muitas pessoas me disseram:- tu é doida, oito dias, eu não ficaria de jeito e maneira. Eu também cheguei a pensar que não conseguiria.  Consegui, foram dias de muita reflexão, paz interior, momentos conflitivos, questionamentos e respostas.
                Ficar em silencio e mais do que não falar.  Eu lá naquele espaço privilegiado, para mim que adoro pássaros, flores, folhagens, mar, lagoa, me botei a observar e a ouvir.  A natureza tem sons singulares. Nunca tinha visto uma gralha azul tão de perto, sua cor intensa, seu canto. As cotias comendo, o lagarto tomando sol, as corruíras entre uma arvore e outra. O vento, vento forte por dias, e a brisa suave permitindo que ficasse no sol fazendo os exercícios espirituais propostos.
                Muito me interroguei, se ficar assim inserida na natureza, me deixando absorver pela observação externa não fugia de uma viajem interna, mais profunda que tinha me disposto a fazer. Vim de um mundo, de uma educação ruidosa, de um local de trabalho intenso, então por si só me permitir nada fazer, simplesmente estar já é uma possibilidade e um resultado.
                Viver ali com mais cinquenta pessoas, passar por elas e não poder falar, não cumprimentar. Almoçar, jantar em silencio, mesmo estando numa mesa com três, quatro pessoas. Olhando aquelas pessoas estranhas, pensando que poderia conhece-las melhor se pudesse falar. E como nós e mais fácil querer conhecer os outros e não a nos mesmo? Porque não dirigir essa série de perguntas a nos.  E ai vamos vendo o que tanto dizemos? Que necessidade de falar que muitas vezes só nos fazem nos perder.
                Ali nesse retiro tive oportunidade de fazer uma leitura dirigida da Bíblia, com uma orientação Inaciana, ou seja proposta por Santo Inácio. Um revolucionário que faz uma releitura, que não foca na dor e no sofrimento, assim com muitos cristão ficaram fixados. Ele traz a vida, o hoje, a gratidão, a compaixão e algo muito importante a autonomia.
                Uma escolha que tinha me parecido ao acaso, terminou me dando respostas a questões que estavam ai desde a adolescência. Ainda estou distante de um silencio mais interno, ainda o mundo externo me seduz por demais, me misturo na natureza, como um camaleão. Adoro ficar como o lagarto, sentindo o sol e brisa, viajo, vou longe. Ou mimeticamente no meio do mato entre as folhas, suas cores, cheiros e texturas, aborda.
                Esse é o primeiro de outros retiros que viram.
Porto Alegre, 24 setembro 2016.

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