sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Dias de chuva
                                                                                                      Magaly Andriotti Fernandes

Eu vinha a dias pedindo que chovesse. Estava querendo hibernar. Adoro ficar em casa dias de chuva. São dias cinzas, aquele ruído de agua caindo instigam a pensar e a refletir sobre a vida.
Adoro dias de chuva para ler, pegar um bom romance sentar-se próximo a janela e ficar ali, sem culpa nenhuma de não estar na rua e mergulhar num romance, num drama ou até mesmo numa ficção.
Agora já há mais de três dias chovendo, já fico pensando que tenho que ter cuidado com o que desejo. Olha ai quanta agua. Eu estou aqui abrigada, geladeira cheia, mil ideias de cardápios.  E os que moram em regiões ribeirinhas, os que moram em casas que tem goteiras? Os que não tem casa? Com essa chuva toda, o que fazer?
Até para as plantações tanta chuva assim não faz bem, ao contrário, destrói plantações inteiras.
Essa chuva coincidiu com o feriado de Nossa Senhora Aparecida, e eu fiquei guardiã da cachorrinha de meu filho caçula. Ela é muito tranquila. Fica deprimida quando seus donos viajam. Escolhe uma poltrona e ali fica. Chamo-a para brincar, brinca um pouco e retorna ao seu trono. Vamos passear na rua, quando a chuva dá uma trégua, e ela logo está pedindo para voltar. Você deve estar pensando, choveu tanto que essa pensa que cachorros falam. Falar não falam, mas existem uma comunicação intensa entre nos. Eu leio os pensamentos dela. Ou melhor os gestos. Quando quer descer fica parada próximo a sua guia de passeio. Quando quer retornar, vai em direção a escada. Os cães são muito inteligentes. Precisamos saber ler o seu comportamento, e a comunicação está feita.
Ela tem medo de trovões, vem correndo para o meu lado e pede colo. Se estou fazendo algum trabalho manual paro um pouco e a tranquilizo. Falo que são apenas trovões. Lembro quando os meninos eram pequenos que eu fazia a mesma coisa. Aliás coisa de gente doida, tranquilizamos nossos pequenos sobre as forças da natureza. A maioria das vezes sim, trovoes, ficam lá fora, os raios da mesma forma. Hoje tem se visto, ventos velozes que destroem tudo, raios que matam pessoas. Meu coração se desassossega. A cachorrinha sente e chora.
Penso que já podia parar de chover. Mas quem eu penso que sou, que o tempo vai acontecer dependendo dos meus desejos.  Que sou o sol?   Que tudo gira em torno de mim?
Pego meu livro e retomo a leitura. A chuva cai la fora, e eu agora já na Sicília, com minha heroína andando a cavalo. Desço numa praia translucida e mergulho.
Um trovão daquele e  a cachorrinha se joga no meu colo.

Porto Alegre, 13 outubro 2017.

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