terça-feira, 1 de novembro de 2016

                                     E as caturritas chegaram

                                                                                  Magaly Andriotti Fernandes

                Moro, no nono andar, de um prédio, bem próximo ao Estuário do Guaíba. Acordar com andorinhas cantando na janela. Ouvindo o canto dos sabias, já é um cotidiano que me faz sentir parte da natureza. Porém de um dia para outro, as caturritas chegaram ruidosas. Não sei se tem alguma associação ou não mas os pardais não mais são vistos por aqui. Um que outro apenas, não aquele número que povoava uma arvore em final de tarde e faziam sinfonia. Pardais e caturitas será que conseguem viver no mesmo espaço?
            Fazem seus ninhos nos coqueiros, nas araucárias, nas arvores mais altas. São ninhos lindíssimos, cheios de gravetos.  Eles lembram prédios, o grupo de caturritas parecem morarem  em andares.
            Os gaviões, seus predadores, também apareceram. Fico ali na janela observando o voo rasante, na tentativa de abocanhar uma delas. Elas são rápidas, voam em grupos. Gritam muito, o que será que dizem? Que tipo de linguagem é essa? Existe sim uma interação. Tem momentos que o grupo voa junto, outros duas a duas, três a três. Meu método de observação não tem uma sistemática.As caturritas, por mim conhecidas, como cocotas, desde a primeira infância. Minha avó  materna tinha uma, ela ficava solta pela cozinha, não voava longe, pois tinha a asa cortada. Ele repetia quase tudo que minha avó falava. O amor humano pelos animais e as vezes muito estranho. Um amor que aprisiona e fere. Minha avó  e ela pareciam muito amigas.  Vovó dava comidinha para ela na boca. Dependendo do que comia, ela deixava a ave pegar o alimento de sua própria língua. Vendo-as, pareciam, mãe e filha.  Um dia ao amanhecer, vi minha avo chorando. A cocota tinha morrido. Diagnóstico caseiro: mal do fígado. Minha avo sofria da vesícula. A relação das duas era mesmo muito singular.
            Passeando pelo bairro, descubro um número significativo de ninhos . Eles são suntuosos, e elas nada discretas. Comem todas as pitangas, abacates, araçás e outras frutinhas pequenas. Essas aves já me deixam incomodada, caminhar e comer pitangas e araçás, uma delícia. Elas são rápidas, não esperam que amadureçam e não me deixam nada.
            Vou pesquisar e verifico que essa invasão na cidade, que no início foi belo, diz da extinção de seu habitat natural. Elas vem para as cidades em busca de alimento e de árvores para poderem reproduzir-se e abrigar-se durante chuvas e vento. Não achei nada que fale da extinção dos pardais na cidades, particularmente na que moro. Minha observação ficou sem conclusão. Os pardais sumiram , e as caturitas chegaram, é isso.

            Essas aves verdinhas e ruidosas, vem nos anunciar que existe uma correlação entre nossas atitudes e suas vidas. Eles comem insetos, o que nós ajuda com relação a mosquitos. O lugar de onde migraram ficaram sem a sua presença, isso com certeza trará danos para aquele espaço. Assim como aqui na cidade nosso ecossistema ficou alterado.  

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