A rua da minha infância
Sou
avó de um menino e duas meninas e mãe de dois homens. Quando menina sempre brinquei muito na
rua. Aliás meu lugar até os onze anos
era a rua. Brincava de boneca, jogava bola, bolas de gude, colecionava carteira
de cigarro, jogava amarelinha, pulava corda. E adorava pegar girinos, sapos
mesmo e observa-los. Assim como os pássaros. Hoje observo meus netos que ficam
muito tempo dentro de casa, e me entristeço. Observo que os prédios não pensam
nas diferentes faixas etárias, que as ruas das cidades não pensam que por elas
passam crianças, púberes e adolescentes.
E
as festas que aconteciam na minha rua, ula lá! Festa junina com direito a
fogueira, pipoca, brincadeiras, danças com todos os moradores da rua. Cada vizinho fazia um prato, todos construíam
a fogueira, organizavam o espaço comum para a festa, bandeirinhas.
Em
Porto Alegre, há mais ou menos quarenta, cinquenta anos atrás, os terrenos eram
quase sítios, as pessoas tinham hortas e pomares. E imaginem vocês que eu,
furtava. Sim furtava dos vizinhos, eu e um grupo de crianças, íamos pegar
bergamota, uva no pátio dos vizinhos. Eu inclusive furtava jabuticaba no pátio
do presidio feminino. Lembro até hoje do sabor de cheiro dessa frutinha, hummm.
O guarda me pegava pela mão e entregava
para minha mãe. Eu como era a menor do grupo subia nas arvores para colher as
frutas, quando viam o guarda, meus amigos saiam correndo e eu lá ficava. E não
dava outra, ia direto para o castigo.
Brincar
de caçador, de cabra cega... ficar até tarde com o grupo de amigos contanto
histórias de terror, lobisomem, bruxas. O problema depois era ir para casa
sozinha. A TV chegou eu já estava com
uns nove anos, mas tinha horário para se assistir, não se podia assim como hoje
assistir a toda hora, e nem os programas infantis estavam à disposição assim e
a rua como deixa-la, não tinha como. Escuto até hoje o chamado dos amigos lá de
fora, nostalgia.
Subir
nas arvores, esperar as pessoas passarem e jogar cinamomo, sementes de
cinamomo. Fazer das raízes das arvores casinha. Usar as arvores para
esconder-se dos demais. Sim a rua era arborizada.
A
saída da escola, a corrida para a casa, vinha sozinha, corria e caia. Tinha uma
verruga no joelho que sangrava, e novas verrugas nasciam. Uma corrida de temor
e liberdade ao mesmo tempo. A rua cheia de mistérios. Ah sim a segurança que o
Pedro e o Paulo garantiam, diante do velho do saco! Isso não tinha preço, era olhar aqueles dois
guardas que apontavam na calcada e a tranquilidade retornava, o coração
compassava.
A
rua era muito atrativa, a rua era segura, a rua era um espaço de encontro e de
troca. Um espaço de convívio das crianças de diversas idades.
Já
com os meus filhos a circulação de crianças na rua, ficou reduzida, e hoje
muito menos ainda. Meus netos vão a rua sempre acompanhados de adultos. Minhas
netas que agora indo residir no interior do Estado vizinho, estão podendo
resgatar o gosto da liberdade de estar sozinhas na rua.
E
a mim resta, as memorias e a firmeza deixadas por esses bons momentos vividos,
a saudade da minha rua querida, dos amigos ali feitos. E aos meus netos quiçá
uma rua virtual, um novo caminho e um novo percurso se faz.
Porto Alegre, 04 abril 2016.
MAGALY ANDRIOTTI FERNANDES
Espetacular!...Ah, se as ruas fossem iguais ao passado!...Quantas lembranças boas...
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