quarta-feira, 6 de abril de 2016

Paineiras

            Mês de março, é o mês onde as paineiras florescem e deixam a cidade rósea. As paineiras povoaram a minha infância de dupla forma. Embaixo delas brincava de casinha, em suas raízes construí muitos castelos, muitos reinados. Embaixo delas muito chorei de medo, pois minha mãe, que tinha por habito me corrigir com palmadas, com cintadas, com varinhas de taquara, me ameaçava amarar numa paineira e lá me deixar.
            Eu, não me deixava vencer, vá que dia desses ela colocasse em pratica seu dito, me antecipava   e cortava todos os espinhos, com uma faca, tirava um a um. E próximo da minha casa tinha mais de uma paineira. Trabalho árduo e cotidiano.
            Com suas painas fazíamos acolchoados. Colhíamos as painas, tirávamos as sementes, colocávamos para secar ao sol, e depois minha mãe fazia uma capa, ou melhor duas, uma de forro. Tudo pronto costurávamos com agulhas gigantes, com pontoes, de um lado ao outro. Esse acolchoado era por mim muito apreciado, pois durantes os medos noturnos era nele que me abrigava, que fugia dos lobisomens, das bruxas, e pasmem do diabo. Minha mãe acreditava em bruxas, em mulas sem cabeça e historias não faltavam para nos apavorar. Só na vida adulta fui me dar conta que ela também tinha medo de todos esses fantasmas, e que os partilhava no sentido de doma-los. De dando luz aos mesmo, quem sabe eles não voltassem.
            E as flores das paineira, faziam um limo daqueles, escorradiu ficava o solo. Mas também eram boas para se fazer de comidinha nas brincadeiras de casinha. Do perfume não consigo me recordar. Mas o encanto pelo tronco forte, pelas raízes que formavam vários recantos, bons esconderijos para as brincadeiras de esconde e esconde. Ficava por ali horas e horas, algumas solitárias, outra com as amigas e amigos.
            Minha mãe tinha uma amiga que associava a gestação das mulheres em geral ao tempo de florescer das paineiras. A Moza dizia, assim era seu nome, março e agosto, mês das mulheres descobrirem-se gravidas, mês que as paineiras florescem. Se tem alguma ciência não sei, mas era algo próprio dela, de suas relações e de seu poder de observação.
            Hoje na rua que me conduz a casa plantaram um correr de paineiras.  E as lembranças que ficaram foram só as boas, as acalentadoras, as acolhedoras, e a saudade, uma saudade sem fim da minha mãe, que para além das palmadas me deu sentido e graça.
MAGALY ANDRIOTTI FERNANDES

PORTO ALEGRE 6 ABRIL 2016.


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