sexta-feira, 6 de maio de 2016

                      A solidão do final de tarde
 

                Uma janela minúscula e uma vista surpreendente. La no alto do Monastério de Santa Catarina, Irta olhava os pássaros que voavam, e pousavam nas flores que enchiam os campos. As oliveiras estavam carregadas e logo viria o momento de colhe-las. Seus pensamentos não ficavam por ali, assim como os pássaros voavam.

                 Minha mãe por essa hora deve estar escondida, assustada. Morar naquele pais, era assim um pavor cotidiano. Ela se recusou a sair, a tentar uma nova vida. Sua irmã mais velha tomou o rumo das Américas, o irmão foi junto. Ela sempre sonhou com a Europa, com a Itália, em seus sonhos os castelos, as igrejas sempre a atormentaram e a deslumbraram
.
                Hoje ela ali no meio daquela calmaria, nem conseguia acreditar. Acorda as cinco, fazer sua higiene, sair para a oração, em seguida para o campo, onde cultiva ervas medicinais. São poucas as mulheres ali naquele convento, em número de nove, de nacionalidades diferentes. Ela logo que chegou nada entendia, mas foi aprendendo o idioma, agora já pensa inclusive nessa nova língua e cultura. Ama mexer na terra aguardar o tempo que deve colher os chás, para melhor aproveitar suas propriedades curativas. Aprendeu o tear, onde fica horas e horas fazendo tapetes, roupas, que são doados para ações sociais para ajudar imigrantes de seu pais e outros que andam por ali.

                Suspira, inspira aquele ar fresco do final de tarde de outono, vislumbra o sol que já está se pondo e deseja tudo de bom para sua família tão distante. Uma lagrima escorre, e pensa que o mundo é feito de escolhas e decisões. Irta decidiu mudar-se, ir em busca de seus sonhos, foi difícil, foi, é difícil ainda hoje, mas ali está ela. E sim descobriu que ser freira, que morar no claustro era sim a sua missão de vida. Suas cartas para irmã não tem respostas, fica imaginando o que pode estar se passando em sua vida, se já tem filhos, que tipo de trabalho a fez ficar por aquelas terras distantes.

                Agora suas irmãs são aquelas, três italianas, quatro vietnamitas, uma francesa. Pouco falam entre si, mas seguem uma rotina diárias de atividades que lhes permite uma vida confortável e razoável junto ao claustro. Cultivam chás e produzem cremes, xaropes, e tecidos que são vendidos na comunidade. Dali de sua minúscula janela ela olha e vê o mundo que lhe tranquiliza, que lhe faz sentir-se parte, mulher e freira, agora no lugar onde antes era só sonho.
Porto Alegre , 5 maio 2016.
Magaly Andriotti fernandes


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