Entre as arvores e a liberdade de expressão
Outro dia um amigo contou –me que ao caminhar pelo parque próximo a sua
casa como lhe e de habito, se indispôs como o funcionário que colocava luzes
nas raízes das arvores. Queria que ele parasse, que não terminasse aquele
serviço de iluminar o parque. Para ele era o caos. Como as arvores irão viver assim
iluminadas o tempo inteiro. Como os pássaros que ali fazem seus ninhos iram
procriar.
Não satisfeito foi até a administração do parque e fez a sua queixa, não
foi escutado e ali parou. Não deu sequência. Retornou para casa cansado,
triste, mais triste do que saíra. O
caminhar que era algo que o distraia, que rejuvenescia a alma, naquele dia
não. Não conseguiu entender como aqueles
boçais, assim se referiu aos dois homens que iluminavam o parque, continuavam
mesmo após ele expor as suas razoes. Ele tem buscado informações sobre o
cuidado de arvores, e verificou que em parques como o Central Parque nos
Estados Unidos, tem a preocupação com o humano, de tornar o parque um lugar
seguro e agradável, onde se pode inclusive andar à noite, e com a sobrevivência
das arvores e dos animais que dependem delas pássaros, cotias, esquilos etc.
E eu fiquei me perguntando, o que houve com a minha geração, que perdeu
o sentido da reivindicação, como se fazer ouvir numa comunidade tão grande
quanto a de uma capital. Porque o obvio, o cuidado com as arvores e os pássaros,
fica relegado. Como o humano ao cuidar de si, não se apercebe que o planeta
precisa de cuidados tanto quanto ele. Como se deu essa dicotomia, essa dissociação.
Um minuto basta para que esse meu amigo tivesse sua vida totalmente
alterada. Ele um homem forte, estava a ponto de partir para vias de fato com o
funcionário e com a sua chefia. A luta pelas arvores, maravilha, politicamente
correta. A forma da luta, será essa? Como se fazer ouvir então? Qual o fórum
para sua luta?
Os parques de nossa cidade estão realmente espaços proibidos na noite.
Iluminar seria uma solução? Solução essa para quem? Tem como contemporizar?
Parece que sim, ele achou uma forma. O que ocorre com as cidades que seus
cidadãos não são consultados, que não são ouvidos, mesmo quando essa fala tem a
ver com uma melhor qualidade de vida.
Sugeri a ele que se acorrente a uma arvore, e chame a imprensa e fale
então o que propõe. Ideia esdrúxula.
Como podemos exercer nosso conhecimento, nossos desejos numa cidade
grande? Ficamos passivos, vendo nossas arvores irem sendo mortas aos poucos,
nossos pássaros não mais podendo se acasalar?
Qual a melhor forma de encaminhamento para o cuidado com as arvores e a
vida dos pássaros, um drama não pessoal, mas sim da comunidade.
Uma simples conversa, e eu preocupada com as arvores, com os pássaros,
mas principalmente, com meu amigo, que poderia num segundo ter mudado
totalmente sua vida se partisse para briga como era sua intenção. Segurou-se,
ficou triste, sentindo-se impotente diante da vida. Mas a sua forma me pareceu
mais um gesto na busca de que alguém se encarregasse de si, do seu desejo e de
seu planeta. Passei vinte e oito anos
ouvindo pessoas que chegaram as vias de fato em suas vidas, que num segundo,
mataram, roubaram, violentaram. Um segundo e tudo mudou em suas vidas. Meu
amigo também, não conseguiu mudar o destino das arvores do parque, mas mudou o
seu. Anda por ai livre, ainda cheio de dúvidas, preocupações, quem sabe um dia
ele se associa a um grupo de defensores da natureza, quem sabe um dia ele
escreva textos sobre isso. Quem sabe vai até o legislativo de sua cidade e
busca algum político que escute a sua causa?
Magaly
Andriotti Fernandes
Porto
Alegre, 09março 2016.
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